Atenção! Rufem os tambores. Há acadêmico dizendo coisa com coisa no Brasil. Toda essa tolice sobre direita, golpe e cretinismos afins foi devidamente tratada por José Murilo de Carvalho em entrevista a Leandro Berguoci, na Folha desta segunda. Apontei aqui há dias que Lula havia feito uma ameaça de modelo chavista ao afirmar que conseguiria pôr na rua mais gente do que a oposição — que nem está por trás dos protestos contra ele. Carvalho concorda. Segue entrevista: .
Reinaldo de Azevedo
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As vaias ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos Jogos Pan-Americanos e o movimento "Cansei" demonstram que acabou a lua-de-mel entre o governo e a classe média. Essa é a avaliação do historiador José Murilo de Carvalho, 67. O professor da UFRJ diz que o presidente tem dificuldade de aceitar oposição e que, se quiser evitar ainda mais turbulências durante o seu mandato, terá de aplacar a classe média de alguma maneira. O historiador a define como "a senhora da opinião pública". Abaixo, os principais trechos da entrevista, feita por e-mail, à Folha.
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FOLHA - As vaias na abertura do PAN, o movimento "Cansei" e o desgaste com o caos aéreo são sinais são sinais de que acabou a lua-de-mel entre Lula e a classe média?
JOSÉ MURILO DE CARVALHO - A lua de mel com a classe média já tinha acabado desde a última eleição. As vaias são a manifestação pública do divórcio.
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FOLHA - Quais são as conseqüências para o governo, a curto e médio prazo, da insatisfação? E para o PT?
CARVALHO - Alguém disse muito bem que já se pode ganhar eleição sem classe média, mas é difícil governar sem ela. A classe média não pode ser conquistada com Bolsa Família nem com aumentos de salário mínimo. E ela é a senhora da opinião pública. Se quiser evitar mais turbulência, o governo terá que aplacá-la de algum modo.
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FOLHA - O PT e a CUT traçam paralelo entre movimentos insatisfeitos com Lula e organizações apoiadoras do golpe de 1964. Há quem compare o "Cansei" à "Marcha da Família". O que o sr. acha disso?
CARVALHO - Retórica. Dificuldade de aceitar oposição. Dificuldade de entender que há um Brasil importante entre o povão e os banqueiros.
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FOLHA - Há alguma chance de o "Cansei" ganhar força a ponto de se tornar um grupo comparável ao MST durante o governo FHC?
CARVALHO - Não. A classe média foi para as ruas em 1964 movida por razões religiosas e políticas, como o anticomunismo, muito fortes, que tinham respaldo popular. Voltou na campanha das Diretas e na do impeachment do presidente Fernando Collor, também com respaldo popular. Agora, esse respaldo é improvável. O apagão ético e o apagão aéreo ajudam a desmoralizar o governo, mas não despertam a reação das classes mais pobres.
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FOLHA - O presidente disse que a oposição está brincando com a democracia e que ele sabe, como ninguém, colocar gente nas ruas. Qual o significado das declarações?
CARVALHO - É uma ameaça explícita. É o que [o presidente] Hugo Chávez fez e está fazendo na Venezuela.
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FOLHA - Lula também disse que só os pobres poderiam estar bravos, já que os ricos ganharam muito dinheiro com seu governo. Isso é uma forma de "getulismo" escancarado?
CARVALHO - As afirmações do presidente nunca primaram pela coerência. A política econômica tem, sim, favorecido, e muito, o setor financeiro e bastante o povão, mas não a classe média, que está espremida entre o tostão e o milhão. E é ela que está mais descontente.
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