Ao ser eleito Lula trouxe aos brasileiros a esperança e a vontade de mudar, de nos tornarmos todos um só, uma vontade de alcançar justiça social, fim da miséria, e tantas outras coisas. Ele representou durante sua trajetória enquanto sindicalista um espírito fervoroso de mudança. Mas infelizmente durante seu governo, quando teve enfim a oportunidade de pôr em prática 25 anos de ativismo e militância, Lula fracassou.
É claro que, como qualquer outra análise política, essa também carrega opinião e subjetividade; entretanto, o leitor deve tentar captar neste artigo a essência do raciocínio e os dados abordados, para enfim poder fazer sua própria reflexão.
No dia 1º de janeiro de 2003, era empossado em Brasília, Luis Inácio Lula da Silva, apoiado por 53 milhões de brasileiros. Em seu discurso solene de posse Lula registrou as seguintes palavras: “’Mudança’: está é a palavra-chave”, “foi para isso que o povo brasileiro me elegeu Presidente da República: para mudar.”, “Em nenhum momento vacilarei em cumprir cada palavra que José Alencar e eu assumimos durante a campanha. Durante a campanha não fizemos nenhuma promessa absurda”. Mas as palavras de ordem deram lugar à dura realidade: quase nada foi feito e o governo assim como Lula caminha para o suicídio político.
O PT articulou mesmo durante a campanha presidencial de 2002, na tentativa exacerbada de conseguir plataforma política no congresso e apoio da camada industrial e comercial. Nessas tentativas começou o que mais tarde compreenderíamos ser uma tragédia. Para conseguir tranqüilizar o mercado teve que incluir na chapa o vice-presidente, José Alencar do PL. Essa talvez tenha sido a primeira venda de ideologia do PT, o PL vai de encontro as matérias mais importantes do ideário dos trabalhadores – o PL tenta reduzir em muito dos direitos trabalhistas, enquanto o PT lutou até então para ampliá-los. Ter Alencar na chapa, apaziguou o temor do mercado de que Lula traria ampliações radicais aos direitos trabalhistas, afinal o vice é um dos maiores industriais têxteis da América Latina. Por mercado entenda-se grandes empresários, investidores, bancos e o fundo monetário internacional (FMI). Isso rendeu ao presidente o apelido dado pela imprensa: “Lulinha paz e amor”.
Já nos primeiros meses de governo aumentou-se a expectativa em torno do governo petista. Foi criado o “Fome Zero”, “Projeto primeiro emprego”, foram enviadas varias reformas para o congresso. Mas também de imediato começavam já a surgir os primeiros indícios de que uma bomba cairia sobre a política brasileira, surgiram “boatos”, todos abafados, de recebimento ilegal de dinheiro para as campanhas do partido. Mas o Brasil continuava seguindo em frente “sem problemas”. Ainda me lembro, que bem no começo do governo, quando foi anunciado o Ministro da Fazenda Antônio Pallocci, saia o então chefe da economia brasileira, Arminio Fraga, e Lula disse que só não o mantinha porque faria transformações profundas na política monetária. Foi a forma que o presidente encontrou para elogiar a condução econômica e o domínio da inflação feitas por Arminio, e eu completo: poucos homens tiveram na história deste país a habilidade administrativa que ele teve, ainda que a custo da aplicação rígida do consenso de Washington.
Bem, embora tivesse soado bem na época, tal reforma nunca aconteceu. Muito pelo contrário, Lula manteve com vigor e ainda ampliou uma política ortodoxa de controle da inflação, mantendo a taxa SELIC nas alturas. E ainda deixou de lado todos os anos de militância contra o FMI, aceitando suas imposições e estabelecimentos, o que nos custou caro. Para atingir o superávit primário estabelecido pelo fundo foram feitos cortes drásticos nos investimentos sociais. Para pagar os juros e encargos da divida foram gastos em 2004 cerca de 183,8 bilhões de reais, já em gastos sociais (como saúde, educação e assistência social) foi de cerca de 72,3 bilhões de reais. – fonte: Senado Federal e Fórum Brasil do Orçamento.
O que também surpreendeu foi a entrega da chefia do Banco Central à Henrique Meirelles, que havia acabado de se eleger deputado pelo PSDB, e foi presidente mundial do BankBoston – o que deu impulso ao primeiro embate com a senadora Heloisa Helena, que foi fielmente contra a entrega da instituição reguladora dos juros, a um “burguês”, como ela mesma chamou. Começava a crise interna dentro do PT.
Cabe lembrar também, ainda a respeito do FMI, que durante anos o PT defendeu o rompimento com a instituição; no entanto em 2005 mesmo com o governo não renovando o acordo com o fundo, continuou seguindo suas diretrizes.
Quanto às reformas, a mais surpreendente foi a previdenciária. Junto com outras reformas, digamos “nada radicais”, e que em maioria foram criadas, não por Lula, mas por governos anteriores. Em especial a, já citada, reforma da previdência foi uma tentativa do governo anterior na qual o próprio Lula assinou uma petição sendo contrário. Alguns anos depois ele próprio estaria enviando a matéria para apreciação no plenário. Então estourou a crise dentro do partido, tendo ido contra a imposição do partido, a senadora Heloisa Helena e três deputados foram expulsos sumariamente. Os principais tópicos do projeto foram: aumentar a idade para aposentadoria e taxações sobre os aposentados.
Outra reforma que deixou o país em desânimo foi a da Reforma Agrária. Lula sempre garantiu o apoio dos trabalhadores rurais sem-terras (MST), no entanto muito pouco foi feito. Ao final do segundo ano de mandato a média de assentamentos ficou em 58,7 mil famílias por ano, no governo Fernando Henrique a média de famílias assentadas foi cerca de 70 mil. O movimento se intensificou e protestou mas foram controlados, pela direção nacional do movimento em comunhão com o PT. A CUT também fez, em acordo, uma série de abafamentos de casos, mantendo os trabalhadores sindicalizados na linha.
Chegando ao ultimo ano de mandato Lula tenta garantir a reeleição com projetos sociais de distribuição de renda. Os projetos implantados por Fernando Henrique, foram ampliados pelo presidente, chegando a marca de 4,9% do PIB brasileiro. Mesmo assim o objetivo dos programas não foi alcançado, criados por FHC para efetuar uma real distribuição de renda no Brasil, extraindo das classes altas através de encargos e entregando aos pobres pelos programas, agora eles são a visão mais clara da utilização da máquina pública em campanhas eleitorais, confirmando o temor que surgiu ainda no governo FHC; de que nas mãos erradas um programa que doa dinheiro pode se transformar em compra de votos, entre uma população menos favorecida, tanto financeiramente quanto de informações.
Isso é comprovado pelas ultimas pesquisas do Datafolha, “O Bolsa-Família é o principal fator da recuperação de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas pesquisas de intenção de voto para a eleição presidencial”, maior parte dos votos que levaram o presidente de volta à liderança vem das famílias dos eleitores beneficiados pelo programa, afirma a pesquisa Datafolha, divulgada neste domingo (26.02.2006)”. “Os novos números do Datafolha mostram que os programas sociais são, para 43% dos eleitores que aprovam Lula, sua principal causa de satisfação”.
A Pesquisa do Datafolha também mostra que o principal motivo alegado por quem desaprova o governo Lula é graças às promessas de campanha não cumpridas: “A corrupção não é o motivo mais citado para a desaprovação de Lula. Entre quem considera sua Presidência ruim ou péssima, os escândalos foram mencionados por 20%, contra 29% que reprovam as promessas não cumpridas”. Entre elas a geração de um número “absurdo” de empregos que foram prometidos, e nunca chegaram à metade do esperado, uma real transformação sócio-politica e a aplicação de uma nova abordagem econômica.
Ainda vale falar que quanto a política econômica, que os animistas elogiaram, devido ao crescimento do país no primeiro ano, agora se mostra totalmente ineficaz. O tal crescimento sentido no inicio do mandato, foi um mero impulso involuntário da política do governo anterior, tanto o é que hoje o país deixa de crescer (só cresceu mais do que o Haiti, e isso porque esse país está em guerra civil), e será pior quanto mais se distanciar da ultima administração. Isso por causa da inviabilidade de manter juros tão elevados – que rende às instituições bancárias o titulo de mais rentáveis dentre as atividades econômicas de serviços (12,6 bilhões, em 2005) – deixando o dólar cair tão drasticamente, desacelerando as exportações agrícolas dos pequenos e médios agricultores, e a não alteração da política tributária, que foi prometida.
Tudo isso sem mencionar os escândalos de corrupção que assolaram o país, sem falar no mínimo que se fosse cumprido o aumento prometido estaria em cerca de R$540,00. E passando direto a dois assuntos que tanto incomodam os petistas que eles simplesmente se calam: durante o governo do presidente Fernando Henrique, Lula foi critico exaltado sobre as tantas viagens do então presidente e da quantidade de medidas provisórias; Vamos direto aos dados, até agosto de 2005 Lula foi o autor de 158 medidas provisórias, cerca de 4,9 por mês. Superou em números dois presidentes: Fernando Collor e FHC. Faz-se necessário uma pequena explanação sobre as MP´s. Essas medidas originaram-se durante a ditadura militar em 67, e foi transmutada para a constituição de 1988. Em síntese é um instrumento autoritário, fruto de um erro histórico que se mantém até hoje. Sua utilização passa por cima do congresso nacional, pois assim que são publicadas entram em vigor, e o congresso tem 60 dias para votar, mas podem ser re-enviadas por mais 60 dias. Foram tantas medidas enviadas que o congresso ficou congestionado, para quem não sabe o congresso possui uma pauta a ser cumprida, qualquer medida que tenha que ser empurrada para o topo da pauta pode atrasá-las durante semanas. Isso fez com que este ano o congresso tenha posto em discussão a limitação das medidas. Elas foram criadas de fato, para que na urgência máxima, e em ultimo caso, fosse colocado em prática uma lei ou decreto. No entanto Lula vêm utilizando-as devida a falta de competência dos lideres no senado e na câmara para a articulação dos projetos. O que também acabou causando o surgimento do “mensalão” – que Lula sabia sim! (porque é o único interessado na governabilidade dentro do legislativo). De fato o PT não possui nenhuma capacidade de articulação e dialogo com os outros partidos, ao contrário de FHC que não raro convenceu os próprios petistas a aprovar suas medidas, negociando outras; abrindo o diálogo com o legislativo. É a diferença básica entre a união dos poderes e a baderna feita por Lula.
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Pedro Melian